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BAIÃO CANAL - Jornal

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A escola e a possibilidade de sonhar

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Agosto já vai adiantado e as férias caminham para o fim. Ainda mal desligamos “da papelada”
e já nos vão chegando os sinais de que o novo ano letivo se aproxima.
Mas sim, deu para descansar. Deu para recarregar baterias e, em boa verdade, consoante se
vai aproximando o final do mês vão aparecendo as saudades da escola. Não da burocracia, mas
das pessoas. Das pessoas que habitam os alunos e as alunas, os professores e as professoras, o
pessoal não docente e toda a comunidade educativa.
Tenho a sorte de pertencer a uma escola que ainda nos deixa sonhar, de ter colegas que ainda
sonham, de ter pais e encarregados de educação que ainda acreditam e confiam em nós e a
escola vai valendo a pena. Traçamos voos com os nossos alunos e as nossas alunas e fazemo-
los acontecer. E vale a pena? Se vale!
Prometi, no final do ano letivo, depois de um ano extremamente desgastante, mas cumprido,
escrever sobre estas coisas do ensinar, do aprender e do aceder ao currículo, a propósito de
experiências vividas e é isso que vou tentar fazer.
Já várias vezes abordei a questão da escola e da sala de aula. Já várias vezes abordei a questão
do uso das novas tecnologias, enfim, um sem número de questões que se colocam à escola,
num tempo de mudança acelerada.
Hoje, prefiro fazê-lo a partir de uma atividade que realizamos com os alunos do 9º ano.
Estamos a falar de gente que viveu os anos de pandemia, que fez o 3º ciclo parcialmente
confinado, com tudo o que isto implicou, quer em termos emocionais e de vivências, quer em
termos de aprendizagem dos conteúdos das diferentes áreas disciplinares, isto é, de
desenvolvimento de competências tendo em vista o perfil do aluno no final do ciclo.
Sonhamos organizar uma viagem de final de ano, a Madrid, para os alunos e as alunas do 9º
ano, afinal o último em que os temos na nossa escola. E o sonho comanda a vida…
Começamos por falar disto aos alunos. Pedimos orçamentos, ajustamos itinerários e reunimos
com os pais e encarregados de educação. Envolvemo-los no sonho e nas formas possíveis de o
transformar em realidade.
Se é verdade que alguns não têm problemas financeiros, também é verdade que outros tantos
têm graves carências económicas. Se é verdade que alguns viajam, outros viram o mar, pela
primeira vez, no 8º ano, numa visita de estudo que eu organizei. Todos e todas tinham que
aprender, tínhamos que tirar partido desta realidade.
Planeámos, orçamentámos, projetámos, calendarizámos e realizámos atividades para angariar
fundos para a viagem. Implicámos tudo e todos. E trabalhámos conteúdos e competências das
diferentes áreas disciplinares.
Reunimos, várias vezes, com as partes implicadas: pais, mães, encarregados/as de educação,
professores/as e alunos/as. Mobilizámos outras parcerias da comunidade e a “coisa deu-se”.
Desde reprodução e venda de plantas até a recolha e venda de usados, rifas e sorteios, fez-se
de tudo, de forma séria e honesta. E conseguiu-se. Com trabalho, muito trabalho. E os nossos
meninos e as nossas meninas aprenderam que a vida se conquista e que com trabalho se
consegue. E a palavra solidariedade e entreajuda ganhou sentido.

Um sonho nascido no início do ano letivo, foi motor de muitas coisas e muitas aprendizagens
ao longo de todo o ano e concretizou-se numa visita de três dias, no final do mês de junho, a
Madrid. E sim, as novas tecnologias ajudam. Criámos um grupo no WhatsApp, com os pais, os
professores acompanhantes e a Direção, onde íamos fazendo o diário de bordo e colocando
algumas fotografias. Isso deu bastante conforto e segurança a todos/as.
Ao longo da viagem, nas muitas conversas que íamos tendo e das questões que nos iam
levantando, fomos percebendo que muitos conteúdos que tínhamos trabalhado em contexto
de sala de aula não tinham sido adquiridos. Não tenho dúvidas sobre as aprendizagens que
fizeram com este projeto e da qualidade das mesmas.
Uma visita que foi lúdica e cultural. Uma experiência que os há-de acompanhar para a vida.
As crianças e os/as jovens aprendem o que vivem. Aprendem com os livros e com as novas
tecnologias, mas aprendem muito mais e de forma consistente, quando, para além destes, lhes
são proporcionadas vivências e visitas. Ver um Miró ou um Picasso numa imagem de um livro
não tem nada que se compare com a visão deste num Museu. Falar das condições
bioclimáticas de uma região ou do relevo plano, não tem nada que se compare com a
observação in loco. Falar da gastronomia de uma região e prová-la são coisas
incomparavelmente diferentes. E poderia continuar a enumerar…
Daí que se torne absolutamente fundamental que a escola seja muito mais do que aquilo que
se passa no interior dos seus muros.
Reinventem-se os espaços/tempos de aprendizagem. Há muitas formas de aprender e de
ensinar. Sobretudo, dentro ou fora dos muros da escola, nunca se perca de vista que estamos
na gramática dos afetos e da empatia e que a relação pedagógica que se instituiu nesta
gramática é muito mais profícua.
A partilha, a corresponsabilização, a liberdade e o compromisso, a vivência, o companheirismo,
a cumplicidade só se aprendem vivendo. E ficam para a vida. E ajudam a viver.
Aos meninos e às meninas que seguiram para novos voos que tenham um mundo de sonhos e
de projetos e que os concretizem. Serão sempre um bocadinho meus…
No dia 1 de setembro, lá estarei de regresso à Escola, para me encontrar e/ou reencontrar com
as pessoas que habitam os elementos daquela comunidade escolar e para continuar a sonhar.

Maria Odete Souto