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BAIÃO CANAL - Jornal

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OS PEQUENOS TAMBÉM SÃO GRANDES | Aníbal Styliano

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Nos finais do mês de Novembro, aconteceu um sacrifício simbólico do futebol, património da Humanidade. Com o tempo imparável, surgiram dirigentes e ideias que transformaram o jogo numa indústria, sem valores, apenas de lucros e também de dívidas. O tempo dos sacrifícios voltou porque se perdeu a memóriaa qualquer preço, tornando-se um vício destrutivo. A noite e o frio alertavam para momento trágico. O futebol foi humilhado por quem não joga e os jogadores, particularmente os jovens da camisola azul, subiram as escadas sabendo o que iria acontecer, com a dignidade de quem dá tudo o que pode, com honra. Nunca uma competição terá prestígio se de um lado estiverem 9 jovens e do outrouma equipa completa e comsuplentes. Os 9 que entraram em campo, por dedicação ao futebol, eram jovens, que tiveram de substituir companheiros infetados por covid. Desses heróis, dois eram guarda-redes (um teve de jogar noutra posição), todos muito novos e oriundos dos sub-23. Mesmo assim, sabendo que iriam defrontar uma das equipas mais poderosas e completas, tiveram a coragem de cumprir ordens e de vencer a humilhação da não comparência. Foi noite de tragédia mas também de ousadia. As instituições que poderiam ter evitado esse injustiça que ficará para a História como momento de vergonha, de incapacidade de justiça, como egoísmo destrutivo, não souberam estar à altura dos acontecimentos. O frio dificultou ainda mais, mas os jovens heróis souberam aceitar a tarefa que lhes exigiram, mesmo sabendo o que iria acontecer. 9 contra 11 desde o inícioé, só por si, traição ao jogo. Mesmo assim, os 9 jovens entraram em campo para prestigiar uma entidade que desconheceu os valores humanos. A forte equipa adversária marcava golos, festejava-os e jogava-se unicamente no meio campo dos azuis. Faltou respeito e solidariedade. E se fosse ao contrário, como se sentiriam esses craques? Lembram-se de goleadas sofridas e com 11 jogadores em campo?

Após o intervalo, os jovens ficaram mais tempo no balneário. Dos 9 vieram 7. E dos 7 houve um que não aguentou mais e o jogo acabou sem honra para os vencedores, para os dirigentes e com resultado volumoso ao qual faltou a ousadia de impor diálogo e respeito. Os que jogam (e venceram?!) também devem pensar nas atitudes a tomar em situações de humilhação a companheiros de profissão. Correu o mundo essa lamentável aventura de quem maltratou o futebol e os jovens jogadores. A incapacidade de diálogo, os argumentos incompreensíveis dos diretores dos clubes, das tutelas e da entidade da saúde, revelaram a sua dimensão moral. Os 9 jovens do B SAD foram heróis, sabiam o que ia acontecer e não vacilaram, defendendo um emblema que não os soube preservar. Golear dessa maneira, quando o jogo nem deveria ter começado, tem implicações num campeonato que se quer valorizado e admirado, nunca espaço de injustiça. Os responsáveis (e são vários) não tiveram a dimensão de impedir um atropelo, numa falta de entendimento do que é o futebol, que deixou dúvidas se não seria preferível abandonarem funções: o futebol com que lidam não é o mesmo dos 9 jovens que entraram a saber o destino, nunca fugindo porque o jogo assim o exige. Não se trata da ancestral história do pequeno David que venceu o enorme Golias, mas de dignidade, de frontalidade, de entendimento de quem o deve viver intensamente e nunca colocar interesses egoístas acima do jogo. Dos três resultados possíveis num jogo, os 9 jovens acrescentaram outro: Dignidade!

Atingimos um ponto em que pode não haver retorno e as eventuais lutas pelo poder, pelos negócios estranhos, pelos milhões em circulação, não se comparam ao que sentiram os 9 jovens, completamente abandonados à sua sorte, mas caminhando na direção do dever.

Que esta grande lição permita corrigir erros e estratégias egoístas, que fomentam fundamentalismos, e pense no sacrifício evitável dos 9 jovens jogadores. No mínimo, quem tem de assumir responsabilidades que o faça e com a máxima urgência.

Por todo o mundo, o nosso futebol ficou ferido na sua integridade e a notícia globalizou-se com prejuízos evidentes para a imagem de Portugal.

Quem não entendeu a gravidade do que aconteceu no Jamor, que se dedique a outra atividade.

 

Aníbal Styliano (Professor e comentador)

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