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BAIÃO CANAL - Jornal

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OBLIQUIDADES (2) | Jaime Milheiro

Jaime Milheiro Os seres humanos rejeitam, por norma,  os portadores daquilo  que   em si próprios  pressentem mas não suportam.

Quem nega ou recalca a sua própria avareza, por exemplo, gozará de óptimas condições para rejeitar e atacar  a avareza dos outros.  No dia a dia obstinadamente a perscruta e numa  incumbente necessidade a toda a hora nos outros inventa  mesquinhices a propósito do dinheiro, transformando-se num  explícito acusador  daquilo que em si  próprio  existe mas não aceita. Sem dar por isso, remexe-se  nas intolerâncias que sempre considera rigorosamente pertinentes e louvatórias dos bons costumes, feito sacristão de si mesmo.

Se admitisse  a   sua própria avareza  suportaria  muito melhor a dos outros e reconciliar-se-ia internamente 

 

                                               (Os idênticos  vislumbram-se,

                                                num formato  pouco consciente,

                                                accionados pela inteligência  matriz … )

 

conseguindo  discernimentos muito mais adequados para os seus julgamentos e preconceitos.

 

Acentuando essa linha:

Só os incapazes de íntima reconciliação  odeiam a vida

Só eles não aceitam as perdas porque nunca no seu  imaginário  aceitarão perder, no balanceio do que foram ou  não foram, do  que fizeram ou não fizeram

São pessoas cuja subjectividade  desconstruiu os   sentimentos básicos de segurança e de esperança

 

                                               (Condição que os fez crescer,

                                               sem tais sentimentos nem  sobreviveriam...)

 

trocando-os por invejas e desconfianças.

 

Rejeitando-se  a si mesmos,  rejeitam  tudo o que à sua volta circula, numa atitude  tanto mais grave quanto mais investida. E  arrastam-se  na queda, recusando  admitir a sua  real participação no que obtiveram ou não obtiveram.

Nesse insólito estrabismo

                                              

                                               (Incapazes de uma justa avaliação

                                               incapazes de uma justa despedida...)

                                                

apenas reconhecem racionalidades utilitárias nas relações onde escorregam noite e dia

delas excluindo a  íntima  capacidade de  sussurro que todos os seres humanos  afagam desde o início  

                                              

                                               (Não  sussurrar será  desumanizar,

                                               será apenas aferir, conferir, deprimir…)

 

mas que a levada sumiu.

Jaime Milheiro

(Arquivo)