Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

BAIÃO CANAL - Jornal

BAIÃO CANAL - Jornal

Olha: lá fora, aqui mesmo a dois passos desta mesa ... | Artigo de Paulo Esperança

zeca.png

Setúbal, 23 de Fevereiro de 1987

 Águas passadas do rio
Meu sono vazio
Não vão acordar
Águas das fontes calai
Ó ribeiras chorai
Que eu não volto a cantar “(…)”

Balada do Outono (EP, Balada do Outono, 1960)

 José Afonso enganou-se completamente! Continuou a cantar, mais que nunca. A sua partida significou, apenas, a passagem para outro tipo de cosmogonia. Do material para o sempre celebrado imaterial, quando vale a pena.

O poeta, andarilho e cantor passou à constelação da utopia – como bem dizia o comandante Alípio de Freitas – quando a morte saiu à rua num dia assim.

É verdade! Mas o que me interessa, neste dia,  é celebrar a vida.Que nos deixou o Zeca dos óculos grandes e olhar distraído?

José Afonso transmitiu-nos de forma indelével  um imaginário que que assenta num princípio básico: é possível construir um mundo sem muros nem ameias com gente igual por dentro e gente igual por fora.

Esse imaginário nasce das suas várias vidas fruto dos processos de aprendizagem que teve oportunidade de ir amealhando.

África deu-lhe o arrebitar de olhos para o colonialismo e para supremacia de quem detinha a capacidade de explorar, reprimir e escravizar.

O continente negro serviu para que José Afonso assumisse de forma superlativa tudo o que havia no racismo e na exploração dos homens/mulheres negro(a)s. Mas mais: os ritmos, os instrumentos, as vozes dessa região do mundo ficaram-lhe nos ouvidos tendo influenciado o futuro da sua obra.

O regresso a Portugal eleva-o a outro patamar: ouvir, ver, recolher, estudar a sabedoria da cultura popular e tradicional que foi incorporando tematicamente nas suas canções, muitas delas usando adaptações.

Numa fase posterior, por acaso e de forma acidental é o imaginário do mundo galego que  entra na sua vida. Diz-nos Benedicto Garcia Villar, no seu “Sonata de Amigos”:fui desafiadoa ouvir em casa de um amigo um disco. Queria que escoitasse o elepé dum “tipo estraño”, um cantor português, porque seguro que me ía a gustar. Aquela audición foi coma se me rebentasen a cabeza. Era tan magnética aquela voz que á primeira oportunidade que me presentou fun na súa busca.Era o álbum “Traz Outro Amigo Também”, 1970.Foi no mês de febreiro do 72 cando aproveitamos um par de días para ir a Porto, cidade na que Discos Orfeu tiña o seu domicilio, na Rua Santa Catarina.

Benedicto, para além de dar a José Afonso o conhecimento sobre a Galiza deu à Galiza um filho que nunca a abandonou. Não terá sido por acaso que o Zeca cantou a “Grândola”, pela primeira vez, no antigo Burgo das Naçons, a 10 de Maio de 1972, em Compostela.

Mas Benedicto deu a José Afonso um outro nível de contacto com a realidade pura e dura: as viagens às Astúrias, os concertos na cuenca minera do ferro e do carvão emocionaram-o face a uma plateia de operários e mineiros explorados e reprimidos pelo franquismo.

A irmandade da comunidade humana fizeram de José Afonso o que sempre foi com o legado que nos deixou. Porque ele foi quem foi – artista, poeta, cantor, andarilho e cidadão – não porque o destino lhe tenha sido traçado, mas porque soube olhar, ouvir, ler, recolher, beber, absorver, no fundo criar e recriar, todo o caldo de cultura e de experiências que a vida lhe foi proporcionando.

José Afonso nunca teria sido quem foi se tivesse vivido sozinho.

Foi toda essa vida vivida que  constituiu uma inquieta e permanente bússola que sempre o orientou para esse lugar intemporal de génio da palavra e da música.

Olha: lá fora, aqui mesmo a dois passos desta mesa onde te recordo, há um pássaro a recolher-se da chuva que, teimosa, vai caindo. Ou serão lágrimas? Seja como for, o pássaro é igualzinho a ti: por mais que tentem, ninguém consegue impedi-lo de voar.(Viriato Teles, Um pássaro igual a ti, artigo publicado no extinto semanário Sete, 25 de Fevereiro de 1987)

 Paulo Esperança

 

 

NOTA DE IMPRENSA | Biblioteca de Baião lê histórias pelo telefone aos mais idosos

Conta Comigo_Biblioteca Baiao (1).jpg

Combater a solidão

Biblioteca de Baião lê histórias pelo telefone aos mais idosos
Uma história de António Mota, um conto tradicional ou um poema de
Florbela Espanca. Estas são apenas algumas das muitas hipóteses oferecidas
pelo novo projeto da Biblioteca Municipal de Baião “Conta Comigo: Leitura à
distância de uma chamada”.
A partir de agora os baionenses podem ouvir novas histórias, e relembrar
outras, através de uma simples chamada telefónica realizada por colaboradores da
Biblioteca Municipal.
O serviço de leitura de contos vai estar disponível todos os dias, até às
21h00, incluindo aos fins de semana.
As inscrições e o agendamento devem ser feitos através da Biblioteca
Municipal de Baião pelo email biblioteca@cm-baiao.pt ou pelo telefone 255
540 562.
O objetivo é combater a solidão e também levar cultura aos cidadãos,
nestes tempos de maior limitação de movimentos.

Para formalizar o pedido é necessário fornecer o nome, a idade e o telefone
de contacto para o qual deve ser feita a chamada. Deve ser ainda indicado o dia e
hora para o contacto.