Odete Souto | “Pérolas” de uma noite de Verão
O mês de agosto é tempo de férias. Tempo de descanso, de recarregar baterias para um novo ano letivo que se avizinha. É tempo de dar mais tempo à família, aos amigos e a nós mesmos. De banhos de sol e de mar. De pôr a leitura em dia e de usufruir de cultura e lazer. Acreditem que fiz de tudo um pouco. Não tanto quanto gostaria e precisava, mas fiz.
E cá estou, de novo, retomando a escrita e as minhas crónicas. Desta feita para falar de um episódio ocorrido nestas férias e que nos mostra a necessidade premente de agarrarmos a educação como desígnio para a promoção de uma sociedade mais justa e onde haja lugar para todos e todas.
Gosto de música de todos os géneros, embora não tenha formação musical, nem grande ouvido. Mas gosto, também, dos textos e dos poemas ditos e cantados. Ou não. Sou atenta à mensagem que veiculam. Gosto de bom fado e fui aos fados. E aquilo que podia ter sido uma noite descontraída deixou-me profundamente inquietada pelos motivos que passo a relatar. A determinada altura, uma fadista cantava “o amor” e, no seu versejar, ia legitimando todos os comportamentos e atitudes, mesmo a violência sobre a “amada”. Fui escutando estarrecida até que, aquela mulher, termina a sua prestação dizendo “… bate naquilo que é seu, ninguém tem nada com isso”. E foi aplaudida. Como é possível?!
E não, isto não se passou no Afeganistão, na Índia ou em qualquer outro país do mundo. Passou-se em Portugal, na cidade do Porto em agosto de 2021.
O que é que temos andado a fazer para que estejamos neste ponto de desrespeito? Onde está a igualdade de direitos? Onde estão os direitos humanos? Onde estão os direitos das mulheres? E chamam a isto amor?
Não, isto não é amor! Não, as mulheres não são propriedade de ninguém, como os homens também o não são. Parafraseando João Pedro Pais, “ninguém é de ninguém…” As mulheres são seres de direitos e têm que ser respeitadas. E têm que se fazer respeitar. Em nenhuma situação uma mulher pode aceitar qualquer forma de violência, por muito que tal seja apregoado em nome do “amor”. É um enorme equívoco que tem que ser combatido por todos os meios.
Precisamos de olhar com olhos de ver para aquilo que se está a passar na Índia, no Afeganistão… em todos os países onde as mulheres são violentadas todos os dias e veem os seus direitos serem cerceados ou mesmo retirados. Nada disto acontece por acaso.
Os direitos humanos não são dados por decreto. São uma conquista e uma luta de todos e todas e de todos os dias. E os direitos das mulheres estão longe de ser respeitados, mesmo nos países ditos civilizados e por pessoas que se consideram muito evoluídas e progressistas. É preciso educar. Educar para a igualdade, para o respeito, para o afeto, para a partilha, para a entreajuda. É preciso resistir e insurgir-se contra este tipo de atitudes. É preciso condenar e nunca aplaudir.
No momento em que me preparo para retomar o trabalho escolar considero que, mais do que nunca, precisamos de colocar estas questões na escola e na educação. E precisamos de educação para a cidadania, mais do que nunca.
Estamos num retrocesso civilizacional e não podemos deixar que isso aconteça. Por nós e pelos vindouros.
Por fim, talvez o amor seja possível, com respeito. Muito respeito e dedicação.
Odete Souto