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BAIÃO CANAL - Jornal

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JAIME MILHEIRO | OBLIQUIDADES (7)

Jaime Milheiro

 De compaginação improvável na  inteligência artificial ou nas   racionalidades costumeiras,  a Arte  concebe-se no conflito e   transporta-se no conflito, numa representação  que  necessariamente  comporta algo de mágico e de infantil.

Serão   os   sentimentos contraditórios do autor que a  fazem emergir e  dão forma ao objecto, sempre mais próximo do sonho do  que da realidade  pragmática e sempre mais assente na  sua própria narrativa  do que na história do tempo que passa.

Sem interioridades em desassossego nada haveria para criar, nada haveria para  construir, nada haveria para reconstruir. Os seres humanos apenas se repetiriam…

 

                                               (Despidos da consciência

                                               da Arte e do seu infinito… )

 

em práticas comerciais ou  em delongas instrumentais.

 

Em qualquer  sistema podem   existir objectos muitíssimo bem feitos,  excelentes reproduções do externo  com  eventuais  pozinhos em cima,  que nunca serão mais do que isso. Serão apenas repetições   sem Arte que  nada mobilizam, ausências de criação e de pessoalidade, coisinhas sem  alvoroço nem sobressalto que nunca farão parte de nós nem  ficarão na História...

 

                                               (Não suscitam oposição,

                                               nem no autor nem no leitor…)

 

mesmo  porventura  apreciadas  na valorização comum e no grupo social  que as enquadra.

 

Arte também só existe quando  indicia parcelas  inconscientes do desejo, embora isso seja bastante mais singularizado  nas  partículas  visuais e auditivas, porque nelas mais facilmente ressoam as   essências da misteriosidade.

No acto fabriqueiro, no acto transmissivo,  no acto  observador,   os seres humanos   repercutem  parcerias desejadamente motivadas e motivadoras. Para além do conflito, desejam  encontros e  reencontros   na criatividade expressa, pelo que  nunca haverá Arte sem espectadores, reais ou imaginários, assentes na estética e  na beleza.…

 

                                               (Na complexa conjugação  

                                               de impulsos, emoções e trocas

                                               paulatinamente  esboçadas....)

 

vicissitudes  que apenas as mentes humanas  estão aptas a desempenhar.

Os seres humanos têm necessidade de  beleza porque a recebem e integram desde o início na sua necessária vida de relação.

Procuram-na,  inundam-se com ela sempre que podem, uma vez que só a “beleza originária” revisitada (o rosto da mãe a sorrir-lhes) os compensa da ideia de morte e dos seus  incomensuráveis negrumes. Mesmo quando na infância destroem objectos só o fazem porque os imaginam  esteticamente reinventados e com isso gostosamente se ocupam.

Viver sem  beleza, procurada e sentida, mesmo rodeado de todas as tecnologias do mundo, será  uma derrotante incumbência.

Corresponderá à depressão total,  à  impossibilidade  de regresso às magias do passado, à fixação na jazida donde provimos e para onde certamente voltamos, sem alento na partida e sem  memória na chegada.

Só   mortiferos absurdos   admitirão que os instrumentos  a possam   substituir...

                                              

                                               (Nas maquinarias

                                               a desumanidade floresce,

                                               os estragos virão depois...) 

 

como se a beleza  e os sentimentos  de beleza  não passassem de   objectos de compra e venda facturáveis nas estações de serviço.

Jaime Milheiro