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BAIÃO CANAL - Jornal

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As Olimpíadas e a Saúde Mental

RIta Diogo é psicóloga e escreve regularmente no Baião Canal.

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Começo esta crónica por referir que não sou psicóloga do desporto, sou sim, uma apreciadora dos Jogos Olímpicos por tudo aquilo que representam em termos de superação, resiliência e competitividade. Portugal trouxe de Tóquio quatro medalhas, 15 diplomas e 35 classificações até ao 16.º lugar. Foram 92 os atletas portugueses que estiveram em competição.

Tivemos a oportunidade de seguir os Jogos Olímpicos de Tóquio, entre 23 de julho e 8 de agosto. Estes jogos foram obviamente condicionados pela pandemia. Mas, não foi apenas por isto que  tivemos umas Olimpíadas diferentes.

Nestes 17 dias de Jogos Olímpicos, a saúde mental gerou uma ampla discussão. De facto, ser “mais forte” vai muito além da força física. Simone Biles surpreendeu o mundo ao abrir mão de competir em algumas modalidades da ginástica artística, priorizando a sua saúde mental.

Se, do ponto de vista da sociedade se aposta tão pouco na psicoeducação, na prevenção e na deteção precoce de possíveis indicadores de perturbação de saúde mental, este fenómeno agiganta-se no contexto desportivo. Seja por razões de preconceito, por atribuição de uma suposta fragilidade, ou por falta de informação ou conhecimento científico, a realidade é que, a tendência para separarmos a saúde física da saúde mental, em nada ajuda aos processos de  reconhecimento da sua importância e da compreensão da sua interligação com a dimensão física. Para qualquer pessoa que não possua conhecimento em termos de literacia em saúde mental, existe uma grande dificuldade em identificar uma lesão emocional, tal como se observa uma lesão física quando se vê uma escoriação ou uma perna partida. Tudo isto dificulta a capacidade em diagnosticar atempadamente perturbações ou sintomas de disfunção psicoemocional e de saúde mental.

As questões relacionadas com a saúde mental encontram-se, demasiadas vezes, mal diagnosticadas o que conduz, inevitavelmente, a uma má gestão das mesmas. Daqui resulta frequentemente que, quando o atleta é atendido pelo especialista em saúde mental, o seu quadro clínico pode revelar já um prognóstico mais complexo e de demorada resolução.

O testemunho de Simone Biles colocou a discussão sobre a saúde mental dos atletas no centro das atenções. Ela é o resultado de uma cultura onde os atletas são encarados como verdadeiros “super-heróis”, onde a robustez e perícias físicas são confundidas com robustez e saúde mental. É fundamental normalizar o recurso à psicologia como forma de optimizar o desempenho desportivo, como área de treino que efetivamente é. A importância da psicologia nos processos de treino desportivo advém de potenciar a resiliência e a capacidade de lidar com fatores de stress acrescido, por exemplo, mas também como forma de elevar os indicadores de performance. Urge repensar o processo desportivo no que respeita à integração precoce de profissionais especialistas na área da saúde mental. É imperioso, desde tenra idade, não só trabalhar na psicoeducação para quebrar o estigma, como na dotação de competências de resiliência dos atletas e também na capacidade de deteção precoce de sinais de desajustamentos de saúde mental. Evidencia-se também a necessidade dos atletas, e das equipas que os assistem, desenvolverem desde a sua formação, as competências necessárias para lidar de forma eficiente com contextos de pressão.

A investigação científica produzida na área vem, desde há alguns anos, a demonstrar que esta visão compartimentada do ser humano, físico vs. mental, pode resultar, no contexto desportivo, num aumento de risco de lesões, num atraso no processo de recuperação da lesão e num comprometimento sério na sua capacidade de desempenho. Da mesma forma, uma performance desportiva abaixo do esperado pode despoletar o risco agravado de sintomatologia e perturbações na área da saúde mental, tais como os fenómenos de natureza ansiogénica e depressiva.

 
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