Rita Diogo | O bullying voltou?
A semana passada assistimos a um vídeo impressionante, em que um jovem foi colhido por um carro, quando tentava fugir das agressões de uma outra jovem da mesma idade. É um vídeo real, impactante, que nos faz sair do nosso conforto e nos faz pensar. O vídeo tornou-se viral nas redes sociais e trouxe a lume um debate importante sobre bullying. Falar sobre estes atos é fundamental numa sociedade que se pretende mais justa, inclusiva e integradora. Quando falamos de bullying é de integração de que falamos, é de educação de que falamos, é de valores de que falamos e é também de violência de que falamos.
A vida escolar e a vida social, devido à pandemia que vivemos, estagnou e passamos a relacionar-nos à distância, durante um período de tempo. Durante vários meses, não existiu contacto diário entre os jovens e crianças. Deixou de se viver e conviver em sociedade, passamos a viver mais isolados, e, portanto, não sujeitos a determinados comportamentos. Entretanto, a rotina começou a voltar à normalidade e os contextos onde os jovens e as crianças estão, não foram exceção. Entretanto, voltamos a ouvir falar de bullying.
O bullying não é um crime mas é composto por vários crimes: a ofensa à integridade física, a coação, a ameaça, a ofensa e a injúria. Sabemos que o bullying não é uma brincadeira, mas sim uma forma de agressão. Sabemos que o bullying não é uma situação de agressividade e/ou violência isolada mas sim continuada e repetida no tempo. Sabemos que o impacto deste tipo de violência pode ser devastador podendo gerar depressão, ansiedade, isolamento, stress pós traumático, reduzida auto estima e até mesmo levar ao suicídio. Sabemos que existem adultos com problemas de ajustamento e graves consequência na sua saúde mental por terem sido vítimas de bullying. Ora, se sabemos tudo isto porque se continua a desvalorizar este tipo de interação e as suas consequências na formação e desenvolvimento dos jovens e da sociedade? A violência gera violência e traduz uma grande dificuldade de viver em sociedade, traduz sempre uma desadaptação a regras sociais. Assim, é preciso reforçar que o bullying não é normal, não faz parte da criança ou do crescimento, não torna as crianças mais fortes ou resistentes à adversidade ou ao confronto. A violência é, assim, a promoção repetida de sofrimento, sem culpabilidade nem reparação! Seja ela física ou psicológica, claro. Quando não há culpa e/ou arrependimento perante a agressividade, esta transforma-se em violência.
O bullying corresponde a um comportamento intencionalmente agressivo, violento e humilhante, que envolve um desequilíbrio de poder: as crianças que fazem bullying usam o seu poder (a sua força física ou o acesso a alguma informação, por exemplo) para controlar e prejudicar outras crianças. É um comportamento repetido ao longo do tempo. O bullying inclui comportamentos como ameaçar, espalhar boatos, atacar alguém fisicamente (bater, arranhar, cuspir, roubar ou partir objectos) ou verbalmente (chamar nomes, provocar, dizer às outras crianças para não serem amigas de uma delas, gozar) ou excluir alguém do grupo propositadamente.
As crianças vítimas de bullying podem sentir-se constantemente com medo, ansiosas, com dores físicas e dificuldade em concentrarem-se na escola. Em muitos casos as crianças vítimas de bullying comprometem-se a permanecer em silêncio sobre as agressões como forma de evitar novas retaliações. Não se sentem capazes de lidar com a situação, achando-se impotentes para resolver o problema. Podem mostra-se zangadas, irritáveis, podem não querer ir à escola, podem dormir mal, ter pesadelos, ter dificuldades de concentração, ter vergonha, estarem mais fechadas e introspetivas.
É fundamental falar com as crianças sobre o que é a violência, como identificamos a agressividade em nós mesmos, o que representa, como se lida com a agressividade dos outros, como ser assertivo. As crianças que sabem o que é o bullying conseguem identificá-lo e podem falar sobre isso se acontecer com elas ou com outros.
É fundamental trabalhar as vítimas e os agressores. O jovem do vídeo não teve, felizmente, sequelas físicas graves que decorreram do atropelamento mas, e as sequelas emocionais? Que consequências terá ao nível da sua saúde mental, estabilidade e ajustamento? Como se fará a reparação desta situação traumática?
Por outro lado, quem agride, quem humilha, quem usa a violência verbal, física ou psicológica como estratégia de relacionamento com os seus pares, parece não estar bem no seu eu, parece desajustado, parece precisar de ofender para não ser ofendido. A ausência de empatia de quem agride é sempre um mau preditor do desenvolvimento.
Devemos considerar seriamente este problema e resistir à tendência para negar ou desvalorizar a su gravidade. O bullying não é um comportamento normal nem faz parte de crescer. Cada criança e jovem deve entender que é um comportamento é inaceitável e que não pode ser tolerado. Os adultos devem transmitir o exemplo da não violência, do respeito pelos outros e da empatia.
Rita Diogo