Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

BAIÃO CANAL - Jornal

BAIÃO CANAL - Jornal

Natércia Teixeira | "...Uma inocência ainda não corrompida..."

Natércia Teixeira

 

A maior solidão é a do ser que não ama. A maior solidão é a dor do ser que se
ausenta, que se defende, que se fecha, que se recusa a participar da vida
humana.
A maior solidão é a do homem encerrado em si mesmo, no absoluto de si
mesmo,
o que não dá a quem pede o que ele pode dar de amor, de amizade, de
socorro.
O maior solitário é o que tem medo de amar, o que tem medo de ferir e ferir-
se,
o ser casto da mulher, do amigo, do povo, do mundo.
Esse queima como uma lâmpada triste, cujo reflexo entristece também tudo
em torno. Ele é a angústia do mundo que o reflete. Ele é o que se recusa às
verdadeiras fontes de emoção, as que são o patrimônio de todos, e,
encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras do alto de sua fria e
desolada torre.

Vinicius de Moraes

Dei de caras com este texto depois de uma conversa casual com um jovem.
Escutar gente nova pode ser fascinante porque nos dá uma visão
desempoeirada das coisas e remete-nos para uma inocência ainda não
corrompida.
Este jovem dava conta da mágoa que lhe suscitou a recusa de um outro jovem,
a uma oferta de cooperação.
Em causa estava a situação de um colega que, com dificuldades de integração,
recusou o auxílio desse jovem para o tentar enturmar.
Com o pragmatismo característico da juventude dizia-me:

“Se fosse eu e alguém me oferecesse ajuda…Eu ficava contente!”

Um caso em que o obvio não é evidente para a pessoa que escolhe posicionar-
se num patamar de inacessibilidade, seja porque enxerga os outros aquém dos
seus desejos ou porque os vê acima das suas possibilidades.
Um entre muitos casos que propiciam comportamentos cada vez mais
comedidos e atitudes espartanas quanto a ofertas de auxílio.
Pese embora a consternação que me causa os desapontamentos de pessoas
bem-intencionadas, compadeço-me mais ainda por personalidades
mesquinhas e pela frugalidade emocional em que vivem, contudo, colocar
limites no altruísmo pessoal e no absurdo alheio são condições inegociáveis
para que o resultado não sejam dois males ao invés de um só.

Dito isto:
Que ao miúdo de olhos generosos, a experiência mostre que devemos acertar
em tudo o que nos for possível, mas não nos devemos martirizar.
Ao outro jovem que a vida ensine de pronto, que muito raramente se cruzará
com alguém disposto a escalar a torre onde se empoleirou e que seguramente
ninguém o tentará duas vezes.
Aos que por aí andam a “semear” pedras…poderão até, ser muito competentes
pedras parideiras, mas não passam seguramente de calhaus com dois olhos.

Natércia Teixeira