Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]
É Natal, o tempo em que se comemora o solstício de dezembro e, portanto, a chegada do inverno no hemisfério norte, com os dias cinzentos, chuvosos e frios. Para os crentes, celebra-se também o nascimento de Jesus.
Para mim, o Natal é a festa da Família e esta é um valor maior. Não sou nada presa ao bulício de Natal, às compras e às prendinhas, ao consumismo que isto envolve. Esse é o lado triste, é o inverno das relações humanas.
Mas sou muito presa ao estar e ao ser, às conversas à volta de uma mesa, ao bulício de fazer comida para muitos e de os ter, de deitar conversa fora, ou apenas ouvir, de recordar, de gargalhar, ou de chorar, se esse for o caso. São as dores que se partilham, as alegrias, as angústias, mas, tal como a partir do solstício os dias vão crescendo e a luz aumentando, também isto faz com que a empatia aumente e os laços e as relações de pertença se aprofundem.
É normal que as pessoas andem mais sensíveis nesta época e não há mal nenhum na sensibilidade. Os corações partidos continuam a ser corações que têm que continuar a bater. Soubéssemos nós transformar esta sensibilidade em amor verdadeiro, em dádiva, em gratidão e o mundo seria bem melhor.
Gosto do Natal, pese embora o facto de cada vez mais, faltarem alguns à mesa. Consoante a idade avança esta realidade será cada vez mais comum. E temos que apresender a viver com ela. Uns partem, mas outros vêm. E precisamos de ver esta dimensão da vida.
Os últimos Natais foram, para mim, muito complicados porque me roubaram esta essência de Natal. A pandemia encarregou-se de promover o afastamento das pessoas e eu não concebo a vida assim.
No último Natal, depois de ter perdido a minha mãe, no mês anterior, o maldito “Covid 19” atirou-me para isolamento e fiquei em “prisão domiciliária”. Foi-me, particularmente, difícil, porque se sempre pugno por um Natal em família, este seria especialmente importante.Foi duro. Mas passou, com miminhos de mão amiga. Os amigos são a família que a gente escolhe...
É Natal e eu gosto do Natal. Um Natal de partilha, amor e encontros. E, à partida, voltarei a poder ter Natal com a minha Família, na casa da minha Mãe, onde vamos buscar este sentimento bom de sermos e de estarmos. Todos juntos. É a casa Natal. A casa que sempre teve portas abertas para todos. Onde apresendemos a dar e receber, a estar disponíveis para os outros, a emprestar ombros e a saber tê-los. A casa onde não se punha o sapatinho na chaminé porque não havia que lhe pôr, mas se partilhava o que havia e a alegria de estar bem, mesmo com pouco.
Gosto deste conceito tribal de Família. Família, não se reduz à família biológica. É de afetos e alarga-se. Todos cabem, assim saibam caber...
Termino com os votos de um Feliz Natal para todos e todas, perseguindo este caminho de amor, paz e gratidão à vida, mesmo quando esta nos apronta aquilo que não esperávamos...
Façamos o Natal acontecer, todos os dias.
Maria Odete Souto
Escrever sobre o Natal é quase “uma frase batida”… paz, amor e harmonia. Para tentar fugir um bocadinho ao cliché e mantendo-me fiel aos assuntos que nos inquietam, nesta crónica e sobre o que para mim significa o Natal (acima de tudo “estar com, ouvir, partilhar”), vou refletir convosco sobre alguns dados divulgados sobre a felicidade (ou falta dela) nos jovens portugueses.
Foram divulgados, recentemente, os resultados do estudo “A saúde dos adolescentes portugueses em contexto de pandemia – dados nacionais 2022” que nos devem preocupar a todos e a todas. Penso que não serão novidade para ninguém, mas poderão perturbar um pouco a nossa consciência e fazer-nos refletir. Destaco apenas alguns dados:
“21% dos adolescentes sentem-se nervosos, 15,8% irritados ou de mau humor e 11,6% tristes quase todos os dias; 12,6% sente-se preocupado todos os dias, várias vezes por dia; 22,8% menciona que quando tem uma preocupação intensa, esta “não o larga” e “não o deixa ter calma para pensar em mais nada”; 19,7% nunca ou quase nunca se sente confiante com a sua capacidade para lidar com problemas pessoais. Em 2018, 18,3% dos participantes referiu que se sentia infeliz e em 2022 essa percentagem aumentou para 27,7%. 47,6% dos adolescentes declara utilizar a internet para fugir de sentimentos negativos”.
É fundamental que, em cada casa, em cada escola e que cada um de nós possa refletir no seu papel na construção da felicidade dos jovens. A expressão de sentimentos é fundamental. Os espaços de fala, de expressão livre do que se sente nos quais existe alguém para ouvir e escutar parece essencial. Estamos a enveredar para uma sociedade que desconsidera os mais jovens, as suas opiniões, o que têm para transmitir. É preciso criar espaços para aprender, escutar, entender e respeitar aquilo que o outro nos transmite. É urgente fomentar a consciência do papel de cada um nas suas próprias lutas, potenciando uma lucidez na criação do pensamento e do discurso. Não podemos silenciar se queremos escutar. Escutar implica disponibilidade, ação, tempo, espaço, um lugar seguro.
Os jovens estão tristes, sim, os seus afetos estão muitas vezes aplanados, sim. Mas qual o contributo da gente madura para contrariar isto? Empurrar a culpa para a utilização da internet, dos jogos ou das redes sociais é aquilo que ouvimos muitas vezes mas demasiado simplista. Parece-me que estes meios só se instalam de forma dominante quando não há diálogo, atividades alternativas, tempo disponível para estar, conversar, fazer coisas juntos. Não há nada de diabólico na internet nem na evolução, há sim uma complementaridade com as relações familiares, escolares, entre pares. Os espaços que se deixam vazios são ocupados, estamos a deixar muitos espaços vazios nos jovens. Os seus silêncios são enormes, insuportáveis para eles mesmos. Não basta perguntar como correu o dia, importa partilhar um pouco do nosso dia. Não basta perguntar como se sente, importa partilhar também o que sentimos. Será que ainda nos lembramos como se faz isto? Será que reconhecemos o que sentimos? Estaremos a caminhar para um analfabetismo emocional?
Continuamos a ouvir aquelas frases: “Não chores, não fiques assim, não fiques triste”. Como se sentir fosse mau. É assim que começamos a adormecer os sentimentos e as emoções, a reprimira capacidade de sentir o mundo, tentando educar para o mais fácil, para aquilo que é bom, para o que não incomoda e não chateia ninguém. É isto que faz com que as crianças cresçam com tão pouca literacia emocional e na crença de que chorar é mau, que é uma fraqueza. A iliteracia emocional impede-nos de lidar com a tristeza ou choro de uma criança, adulto ou de nós próprios. Por isso, neste Natal tente ouvir mais, escutar mais, estar mais disponível, criar espaços e lugares de fala, de expressão de sentimentos, reinvente-se, reinvente a sua forma de estar com o outro.
FELIZ NATAL!!!!
Rita Diogo