Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

BAIÃO CANAL - Jornal

BAIÃO CANAL - Jornal

NACIONAL | Celebração dos 100 anos do nascimento de José Saramago começa hoje

estatua2.jpg

A aldeia natal do Nobel da Literatura José Saramago vai assinalar, na terça-feira, a data em que o escritor faria 99 anos com a plantação da 99.ª das “100 oliveiras para Saramago” que estão a ser plantadas na Azinhaga, Golegã.

A Fundação José Saramago, que tem um polo na Azinhaga, concelho da Golegã, distrito de Santarém, inicia na próxima terça-feira, 16 de novembro, dia em que se assinala o 99.º aniversário do nascimento do escritor, as celebrações do seu centenário com a plantação da 99.ª oliveira, das 100 que decidiu plantar na aldeia natal de Saramago.

“A ideia seria, recuperando um pouco a mágoa que o próprio José Saramago várias vezes referiu, pelo facto de na Azinhaga já não existir o olival e as oliveiras como ele tinha conhecido em criança, que seria bonito a celebração do seu centenário com a existência de cem oliveiras plantadas em sua homenagem”, disse à agência Lusa a curadora da Fundação José Saramago responsável pelo polo da Azinhaga, Ana Matos.

Apresentado à Câmara da Golegã e à Junta de Freguesia da Azinhaga, em 2019, o projeto foi apadrinhado por um agricultor da região, Manuel Coimbra, que “prontamente ofereceu 100 oliveiras com algum porte”, disse.

Nos últimos dois anos foram plantadas 98 oliveiras, na sua maioria concentradas numa das ruas principais da aldeia, a rua Vítor Guia, e outras espalhadas pela aldeia, com a 99.ª a ser plantada na terça-feira, assinalando o início das celebrações do centenário.

Cada uma das oliveiras receberá o nome de uma personagem saramaguiana, depois de ser acertada com o município da Golegã a forma como essa designação será representada, sendo a proposta a da inscrição no pavimento, adiantou Ana Matos.

A centésima oliveira será plantada no dia 16 de novembro de 2022, data em que Saramago faria 100 anos, e a árvore receberá o nome da sua avó materna, Josefa.

Também na terça-feira acontecerá a iniciativa “Leituras Centenárias”, resultante de um desafio lançado pelo Comissariado do Centenário às escolas “um pouco por todo o país”, mas também em Espanha e na América Latina, acrescentou.

Em mais de uma centena de escolas portuguesas, entre as quais as do Agrupamento de Escolas da Golegã, Azinhaga e Pombalinho, alunos do ensino básico vão ler, em simultâneo, a partir das 10:00, o conto “A Maior Flor do Mundo”, numa iniciativa que junta a Fundação José Saramago, a Rede de Bibliotecas Escolares e o Plano Nacional de Leitura.

No Brasil, de acordo com a embaixada portuguesa, também a partir das 10:00, a iniciativa mobiliza escolas de Brasília, Belém, São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Natal, Recife, Fortaleza, Curitiba e Porto Alegre, assim como nas localidades de São Jerónimo, em Rio Grande do Sul, e de Pedro Leopoldo, em Minas Gerais.

A Embaixada de Portugal e a rede de consulados portugueses, no Brasil, instituições universitárias e escolares brasileiras, o Camões – Centro Cultural Português em Brasília e a Feira Literária de Poços de Caldas (Flipoços) abrem, por seu lado, as suas redes sociais à transmissão das sessões de leitura, associando-se assim ao projeto da Fundação José Saramago.

“A Maior Flor do Mundo” faz parte do currículo escolar do 4.º ano do Ensino Básico, em Portugal, e do Ensino Fundamental do Brasil.

Paralelamente, em Portugal, os alunos da escola Mestre Martins Correia, na Golegã, vão inaugurar uma exposição de desenhos, intitulada “Retratos”.

Ao longo do dia de terça-feira, as sete bibliotecas da Rede de Bibliotecas José Saramago, em Almada, Avis, Beja, Leiria, Loures, Montemor-o-Novo e Odemira, promovem diversas atividades, estando marcadas para as 18:00 leituras encenadas, maratonas de leitura, leituras pelas redes sociais, entre outras.

A sessão de abertura do Centenário está marcada para as 20:00, no São Luiz Teatro Municipal, em Lisboa, com a escritora Irene Vallejo, que lerá um “Manifesto pela Leitura”, seguindo-se um concerto pela Orquestra Metropolitana de Lisboa, dirigida pelo maestro Pedro Neves.

O programa do concerto é composto por “As Sete Últimas Palavras de Cristo na Cruz”, de Joseph Haydn, com leitura de textos de José Saramago pela atriz Suzana Borges, numa parceria da Fundação José Saramago com a Câmara Municipal de Lisboa.

Ana Matos salientou que, além das atividades que estão a ser preparadas pela Fundação José Saramago, com “muito do cunho do pensamento” do comissário para as comemorações do Centenário, Carlos Reis, há um conjunto de iniciativas que estão a surgir “de uma forma muito espontânea, muito autónoma”, da sociedade civil, das escolas, de associações, que vão de leituras, a apresentações de peças de teatro, a exposições de artes visuais.

Afirmando ser com “alegria” e “comoção” que a Fundação recebe essas iniciativas, Ana Matos considerou-as “um sinal da força maior que o José Saramago ainda hoje continua a representar, não só pela sua literatura, mas também pelo seu pensamento”.

A programação do Centenário pode ser consultada em: www.josesaramago.org. .

Lusa

 

 

 

Natércia Teixeira | Confiança

natercia teixeira.jpg

 

... Deixei-me ficar na cama, embalada por pensamentos e perdida em antevisões.

Aconchegada pelo carinho do Eros, acabei por adormecer novamente num sono leve, povoado de sonhos e premonições.

Via-me sozinha a descer a encosta de uma serra.

Ao fundo um grande lago pintado de negro pelo reflexo do céu carregado pela borrasca que se aproximava.

Descia o mais rapidamente que podia, para me tentar antecipar à tempestade que pressentia nas minhas costas...uma vã tentativa de fugir ao temporal…à solidão que sentia no peito, ao sabor do medo e do abandono.

Sabia não haver escapatória…uma carga de água, prestes a alcançar-me iria abater-se sobre mim.

Corria em direção ao lago sem nenhum propósito e também não procurava refúgio no arvoredo que me rodeava.

A chuva começou a fustigar-me e eu continuava em debandada.

Relâmpagos riscavam o céu cinza escuro e os trovões explodiam por cima de mim.

Eu continuava em fuga sem avistar um porto de abrigo.

O bater do meu coração...o meu próprio ofegar, misturavam-se com o ruído da tempestade que me perseguia.

Outro som sobrepôs-se e despertou-me daquela angústia...um som insistente e desconectado daquela realidade paralela...o som de chamada no meu telemóvel.

Aturdida e confusa peguei-lhe...era da biblioteca...significava que já passava das nove da manhã e devia haver alguma notícia sobre o meu pedido de licença.

Precisava de me recompor e decidi não atender, retornaria a chamada mais tarde.

Levantei-me, bebi água e fui refrescar-me.

Liguei a televisão e a música serpenteou no espaço.

Devidamente recomposta e calma, devolvi a chamada...intuía que o motivo do contacto era o passaporte para a minha nova vida.

A colega que me atendeu confirmou, sem surpresa, a necessidade da minha presença no sector de recursos humanos para formalizar o procedimento da minha licença, surpresa foi a abordagem que se seguiu.

Cautelosamente e desculpando-se pela intromissão, questionou-me sobre o destino que iria dar à minha casa durante o tempo de ausência.

Apanhada de surpresa, confessei não ter ainda decidido nada e exprimi disponibilidade para aceitar propostas, o mote perfeito para a minha colega, alegremente me comunicar que tinha a solução perfeita para o problema.

Quem me vinha substituir seria uma conhecida dela de Cascais, que pedira a transferência porque o marido, enólogo, iria realizar um trabalho numa quinta aqui próximo.

Esse casal, tinha absoluta necessidade de arranjar alojamento para se instalar rapidamente, portanto, no caso de eu estar na disposição de alugar temporariamente a minha casa, ambas as partes beneficiariam com a situação.

Confesso que a sincronicidade do universo me deixou perplexa...a ponto de o meu silêncio ser entendido como hesitação.

Entusiasmada e nada apreensiva com a recomendação, agradeci pela inesperada sugestão.

Tudo parecia conspirar a favor dos meus intentos e se encaminhava para que durante a tarde, trabalho e casa fossem assuntos resolvidos.

Depois de desligar, dei com o Eros a olhar-me fixamente...parecia estar a compreender o que se passava, mas não comungava da minha excitação.

Suspirou e ficou sentado diante de mim, estático, a olhar-me e a parecer perguntar-me se tinha a certeza sobre o que me preparava para fazer.

Baixei-me.…abracei-o e sussurrei-lhe na orelha macia: "vai correr bem..."

Abanou a cauda e pareceu convencido.

Dirigir-se alegremente para a cozinha era a confirmação que a apreensão tinha desaparecido e a sua forma de me comunicar um "confio em ti!".

Sorri intimamente...era isso...tudo se resumia a uma única questão: Confiança.

Senti uma muito discreta pressão no peito...uma brisa suave entrou pela janela aberta da cozinha...um subtil arrepio percorreu-me o corpo...um ínfimo ponto brilhante de duvida acendeu-se na minha mente.

E eu?.... Eu confiava?

 

 In Grãos de Pimenta Rosa

Natércia Teixeira